MOÇAMBIQUE : Rescaldo do Nacional Feminino - Vénia às encantadoras damas de ferro(viário)
ACABRUNHADA e com uma face indisfarçadamente tristonha, a "catedral" da nossa bola-ao-cesto acompanhou ao longo da última semana, sem o entusiasmo que lhe é apanágio nestas circunstâncias, o desenrolar do Campeonato Nacional de Basquetebol de Seniores Femininos. Uma prova que, contrariamente àquilo que tínhamos vivido no mês anterior, no Chiveve, em que os beirenses, todas as noites, lotaram por completo o pavilhão local para com muito calor e paixão seguirem a super competição de masculinos, o público praticamente virou-lhes as costas, surpreendentemente e de forma arreliadora no dia da final, em que se esperava casa cheia, tendo em conta o atractivo prato que seria servido.
Mas, quem não esteve com meias medidas é o Ferroviário, que não somente chamou a si o título, o segundo no seu historial, no epílogo de uma partida extremamente dramática diante do rival ISPU, por 17 pontos de diferença (77-60) como também fez jus a todo o investimento que levou a cabo esta temporada, com a derradeira novidade, e de grande vulto, de nome Pauline Nsimbo, a vir da RD Congo e encaixar-se com uma luva num time em que a abundância e a homogeneidade andaram de mãos dadas, pedra de toque para um sucesso que já era previsível aos olhos dos aficionados da modalidade.
A despeito das incontornáveis ausências de Nádia Rodrigues, Ana Flávia Azinheira e Carla Silva, internacionais de qualidades espectaculares e que seguramente teriam emprestado outra cor e alegria ao campeonato – sem qualquer desprimor àquelas que também com a sua alegria deram corpo ao evento - estava mais do que claro, para os prognósticos e conjecturas de "todo o mundo", de que o campeão sairia do despique entre Ferroviário, que defendia o "canecão" ganho na temporada anterior, em Quelimane, e coincidentemente arrebatado frente ao ISPU, igualmente com os olhos postos no pedestal de honra, na tentativa de se redimir das constantes derrotas perante o seu principal adversário.
Devido ao número de equipas presentes na prova, oito, após ter sido aventada a hipótese de uma dezena, no entanto, a ruir face à desistência das representantes de Inhambane, Liga Muçulmana da Maxixe e Escola Superior de Hotelaria e Turismo, era inevitável que Ferroviário e ISPU fossem cabeças-de-série. Às "locomotivas" calharam Maxaquene, o único à altura de lhes fazer frente, Quelimanenses, da conhecida veterana Diara Dessai, e Escola Secundária Francisco Manyanga, de Tete, que se reforçaram por jogadoras da Académica de Maputo, na tentativa de lhes conferir alguma estabilidade competitiva, pois o fosso com os seus adversários da capital do país era muito grande.
MUITOS OVOS PARA TÃO DELICIOSA OMELETA
Depois do primeiro investimento em 2005, que incluiu astros como Rute Muianga, Zinóbia Machanguana e Nádia Rodrigues, que se interagem perfeitamente com o técnico Carlos Aik, com quem trabalharam no Maxaquene ou na selecção, este ano, as atenções viraram-se para o debilitado ninho da Académica, donde saíram as jóias Deolinda Gimo e Janete Monteiro, numa lista que incluiu as ex-"alvi-negras" Júlia Machalela, regressada dos Estados Unidos, e Márcia Langa, assim como, para o recém-terminado campeonato, a badalada Pauline Nsimbo, nova rainha-mãe "locomotiva". Sem dúvida nenhuma um arsenal verdadeiramente inexpugnável, até porque Sílvia Langa e Ondina Nhampossa mantêm as suas qualidades de peso, Kátia Machai regista substanciais melhorias, as debutantes Tatiana Ismael e Inocência Fondo, no meio da constelação de tantas estrelas, estão "condenadas" também a brilhar, esperando apenas pelo seu tempo de crescer e aparecer.
Ora, perante esta abundância de ovos, Carlos Aik, coadjuvado por Assane Adamo, outra alternativa não tinha que não fosse o confeccionar omeletas deliciosas. O calendário do Ferroviário, cuja estreia ocorreu diante da Francisco Manyanga, possibilitou ao "mister" efectuar a rodagem que precisava, não exactamente para conhecer as jogadoras, porque isso estava fora de hipótese, mas para aquilatar o seu nível competitivo, depois de várias ausências em termos de equipa, ditadas pelos compromissos das selecções. Por isso mesmo, havia também o desejo de avaliar o grupo, entanto que tal, até porque, por outro lado, tinha acabado de chegar uma atleta que "de caras" devia merecer o lugar.
FIGURANTES PARA RODAR
Foi nesta base que Aik, diante das tetenses, entrou com um determinado "cinco", formado por Kátia, Rute, Pauline, Márcia e Ondina, para, transcorrida metade do primeiro período mudar tudo de avesso, fazendo alinhar um outro, desta feita constituído por Zinóbia, Janete, Julinha, Deolinda e Sílvia. É claro que, tendo em conta o modesto arcaboiço competitivo das adversárias, a situação era perfeitamente favorável para as "locomotiva" se darem ao luxo de fazer tudo quanto lhes apetecia, porém, sem perder de vista o essencial, que era ganhar o jogo e desde logo ditar as regras na globalidade do campeonato, na sua qualidade de detentoras do título e de super candidatas à renovação. O resultado (111-47) traduziu fielmente as pretensões do Ferroviário, a sua grandeza e acima de tudo a ideia de que as vitórias, não interessa o nível do oponente, são sempre uma mola impulsionadora para o alcance do objectivo final.
Aliás, embora cada artista tenha o seu peso e até capacidade de desequilibrar, o treinador foi insistindo na necessidade de se fazer prevalecer o espírito de grupo, o jogo colectivo como arma basilar para o sucesso. Os embates com equipas figurantes, casos da Francisco Manyanga e das Quelimanenses, serviram precisamente para esse efeito, isto é, para Aik ir ensaiando vários esquemas tácticos e construir a estrutura ideal para a aguardada final, pois a transição para tal era indiscutível. O percurso durante a primeira fase teve, portanto, este condão, até mesmo o surgimento de um Maxaquene que procurou oferecer alguma réplica – as "tricolores" Gracinda Bucar e Esmeralda Casimiro deram cartas – serviu para a equipa provar certas dificuldades e saber como se desenvencilhar perante vicissitudes desta natureza.
SALTAR BARREIRAS
Já era previsível que a etapa decisiva seria extremamente complicada. E começou precisamente nas meias-finais, diante de um Desportivo que nessa noite se apresentou em campo transfigurada e a travar-se de razões com as campeãs. É verdade que, do ponto de vista de soluções, as "locomotivas" eram francamente superiores às "alvi-negras", no entanto, a atitude positiva destas, a crença inesgotável nas suas forças e, por que não, a tentativa de fazer uma gracinha, valorizaram sobremaneira o espectáculo, sobretudo porque momentos houve em que a diferença no marcador foi mínima, chegando a pairar no ar o espectro de uma surpresa.
Foi uma partida em que, para além do brilhante envolvimento da congolesa, que já nos ia deleitando com a sua classe, registou-se o ressurgir de Rute, após uma sequência de jogos praticamente desaparecida. A irmã de Sete Muianga habituou-nos a jogar bem, à semelhança da contemporizadora Zinóbia, só que ambas, neste campeonato, estiveram longe do seu esplendor. Em contraponto, Anabela Cossa protagonizou uma série de roubos de bola que quase deixaram Aik à beira de um ataque de nervos, repreendendo justamente as bases Janete e Kátia, insuficientes para a inteligência e perspicácia da "alvi-negra", que assinou 12 pontos e a sua colega Kátia Halar 19, o que é de assinalar, perante um adversário da índole das campeãs.
MARAVILHOSA SINFONIA
Da final, ainda se guardam reminiscências de um desafio bastante equilibrado, espectacular e, como dissemos na altura, impróprio para cardíacos, dada a incerteza que foi prevalecendo até à conclusão dois 40 minutos regulamentares, com o marcador a registar 60 pontos para cada lado. Contrariamente ao que vinha fazendo, o técnico do Ferroviário já não deu oportunidade a todas as jogadoras. Limitou-se ao mesmo grupo de cinco, Zinóbia (40.30 minutos em 45 jogados), Rute (32.59), desqualificada com cinco faltas, o que não é normal nesta atleta, Janete (39.37), Pauline (40.25) e Deolinda (35.36), dando chance, a espaços, a Julinha (20.12), que normalmente trocava com Machanguana.
Já o ISPU, embora Armando Meque também não oferecesse muito descanso às suas unidades nucleares, procurou rodar mais a equipa, o que de certa forma baralhou o Ferroviário. Isto porque, quando por exemplo se supunha que disparasse no marcador para uma vantagem confortável, as "universitárias" respondiam prontamente, situação mais visível no decorrer do quarto período, altura em que lograram chegar à igualdade e forçar o prolongamento, depois do lance polémico de uma falta sobre Vaneza Júnior, não assinalada pelo juiz internacional Abreu João, mesmo nas suas barbas.
O período extra trouxe duas realidades completamente díspares: uma sinfonia harmonicamente perfeita, música penetrante e a um ritmo maravilhoso, do lado do Ferroviário; um adormecimento incompreensível, como se as forças da equipa tivessem sido reguladas somente para 40 minutos, pelo ISPU. Ora, porque as decisões dos campeonatos, por vezes, acontecem em fracções de segundos, as "locomotivas" souberam, nesse período, vincar todo o seu virtuosismo e mostrar que continuam verdadeiras damas de ferro, oferecendo um feliz Natal a elas próprias e a toda a família verde-e-branca...
Mas, quem não esteve com meias medidas é o Ferroviário, que não somente chamou a si o título, o segundo no seu historial, no epílogo de uma partida extremamente dramática diante do rival ISPU, por 17 pontos de diferença (77-60) como também fez jus a todo o investimento que levou a cabo esta temporada, com a derradeira novidade, e de grande vulto, de nome Pauline Nsimbo, a vir da RD Congo e encaixar-se com uma luva num time em que a abundância e a homogeneidade andaram de mãos dadas, pedra de toque para um sucesso que já era previsível aos olhos dos aficionados da modalidade.
A despeito das incontornáveis ausências de Nádia Rodrigues, Ana Flávia Azinheira e Carla Silva, internacionais de qualidades espectaculares e que seguramente teriam emprestado outra cor e alegria ao campeonato – sem qualquer desprimor àquelas que também com a sua alegria deram corpo ao evento - estava mais do que claro, para os prognósticos e conjecturas de "todo o mundo", de que o campeão sairia do despique entre Ferroviário, que defendia o "canecão" ganho na temporada anterior, em Quelimane, e coincidentemente arrebatado frente ao ISPU, igualmente com os olhos postos no pedestal de honra, na tentativa de se redimir das constantes derrotas perante o seu principal adversário.
Devido ao número de equipas presentes na prova, oito, após ter sido aventada a hipótese de uma dezena, no entanto, a ruir face à desistência das representantes de Inhambane, Liga Muçulmana da Maxixe e Escola Superior de Hotelaria e Turismo, era inevitável que Ferroviário e ISPU fossem cabeças-de-série. Às "locomotivas" calharam Maxaquene, o único à altura de lhes fazer frente, Quelimanenses, da conhecida veterana Diara Dessai, e Escola Secundária Francisco Manyanga, de Tete, que se reforçaram por jogadoras da Académica de Maputo, na tentativa de lhes conferir alguma estabilidade competitiva, pois o fosso com os seus adversários da capital do país era muito grande.
MUITOS OVOS PARA TÃO DELICIOSA OMELETA
Depois do primeiro investimento em 2005, que incluiu astros como Rute Muianga, Zinóbia Machanguana e Nádia Rodrigues, que se interagem perfeitamente com o técnico Carlos Aik, com quem trabalharam no Maxaquene ou na selecção, este ano, as atenções viraram-se para o debilitado ninho da Académica, donde saíram as jóias Deolinda Gimo e Janete Monteiro, numa lista que incluiu as ex-"alvi-negras" Júlia Machalela, regressada dos Estados Unidos, e Márcia Langa, assim como, para o recém-terminado campeonato, a badalada Pauline Nsimbo, nova rainha-mãe "locomotiva". Sem dúvida nenhuma um arsenal verdadeiramente inexpugnável, até porque Sílvia Langa e Ondina Nhampossa mantêm as suas qualidades de peso, Kátia Machai regista substanciais melhorias, as debutantes Tatiana Ismael e Inocência Fondo, no meio da constelação de tantas estrelas, estão "condenadas" também a brilhar, esperando apenas pelo seu tempo de crescer e aparecer.
Ora, perante esta abundância de ovos, Carlos Aik, coadjuvado por Assane Adamo, outra alternativa não tinha que não fosse o confeccionar omeletas deliciosas. O calendário do Ferroviário, cuja estreia ocorreu diante da Francisco Manyanga, possibilitou ao "mister" efectuar a rodagem que precisava, não exactamente para conhecer as jogadoras, porque isso estava fora de hipótese, mas para aquilatar o seu nível competitivo, depois de várias ausências em termos de equipa, ditadas pelos compromissos das selecções. Por isso mesmo, havia também o desejo de avaliar o grupo, entanto que tal, até porque, por outro lado, tinha acabado de chegar uma atleta que "de caras" devia merecer o lugar.
FIGURANTES PARA RODAR
Foi nesta base que Aik, diante das tetenses, entrou com um determinado "cinco", formado por Kátia, Rute, Pauline, Márcia e Ondina, para, transcorrida metade do primeiro período mudar tudo de avesso, fazendo alinhar um outro, desta feita constituído por Zinóbia, Janete, Julinha, Deolinda e Sílvia. É claro que, tendo em conta o modesto arcaboiço competitivo das adversárias, a situação era perfeitamente favorável para as "locomotiva" se darem ao luxo de fazer tudo quanto lhes apetecia, porém, sem perder de vista o essencial, que era ganhar o jogo e desde logo ditar as regras na globalidade do campeonato, na sua qualidade de detentoras do título e de super candidatas à renovação. O resultado (111-47) traduziu fielmente as pretensões do Ferroviário, a sua grandeza e acima de tudo a ideia de que as vitórias, não interessa o nível do oponente, são sempre uma mola impulsionadora para o alcance do objectivo final.
Aliás, embora cada artista tenha o seu peso e até capacidade de desequilibrar, o treinador foi insistindo na necessidade de se fazer prevalecer o espírito de grupo, o jogo colectivo como arma basilar para o sucesso. Os embates com equipas figurantes, casos da Francisco Manyanga e das Quelimanenses, serviram precisamente para esse efeito, isto é, para Aik ir ensaiando vários esquemas tácticos e construir a estrutura ideal para a aguardada final, pois a transição para tal era indiscutível. O percurso durante a primeira fase teve, portanto, este condão, até mesmo o surgimento de um Maxaquene que procurou oferecer alguma réplica – as "tricolores" Gracinda Bucar e Esmeralda Casimiro deram cartas – serviu para a equipa provar certas dificuldades e saber como se desenvencilhar perante vicissitudes desta natureza.
SALTAR BARREIRAS
Já era previsível que a etapa decisiva seria extremamente complicada. E começou precisamente nas meias-finais, diante de um Desportivo que nessa noite se apresentou em campo transfigurada e a travar-se de razões com as campeãs. É verdade que, do ponto de vista de soluções, as "locomotivas" eram francamente superiores às "alvi-negras", no entanto, a atitude positiva destas, a crença inesgotável nas suas forças e, por que não, a tentativa de fazer uma gracinha, valorizaram sobremaneira o espectáculo, sobretudo porque momentos houve em que a diferença no marcador foi mínima, chegando a pairar no ar o espectro de uma surpresa.
Foi uma partida em que, para além do brilhante envolvimento da congolesa, que já nos ia deleitando com a sua classe, registou-se o ressurgir de Rute, após uma sequência de jogos praticamente desaparecida. A irmã de Sete Muianga habituou-nos a jogar bem, à semelhança da contemporizadora Zinóbia, só que ambas, neste campeonato, estiveram longe do seu esplendor. Em contraponto, Anabela Cossa protagonizou uma série de roubos de bola que quase deixaram Aik à beira de um ataque de nervos, repreendendo justamente as bases Janete e Kátia, insuficientes para a inteligência e perspicácia da "alvi-negra", que assinou 12 pontos e a sua colega Kátia Halar 19, o que é de assinalar, perante um adversário da índole das campeãs.
MARAVILHOSA SINFONIA
Da final, ainda se guardam reminiscências de um desafio bastante equilibrado, espectacular e, como dissemos na altura, impróprio para cardíacos, dada a incerteza que foi prevalecendo até à conclusão dois 40 minutos regulamentares, com o marcador a registar 60 pontos para cada lado. Contrariamente ao que vinha fazendo, o técnico do Ferroviário já não deu oportunidade a todas as jogadoras. Limitou-se ao mesmo grupo de cinco, Zinóbia (40.30 minutos em 45 jogados), Rute (32.59), desqualificada com cinco faltas, o que não é normal nesta atleta, Janete (39.37), Pauline (40.25) e Deolinda (35.36), dando chance, a espaços, a Julinha (20.12), que normalmente trocava com Machanguana.
Já o ISPU, embora Armando Meque também não oferecesse muito descanso às suas unidades nucleares, procurou rodar mais a equipa, o que de certa forma baralhou o Ferroviário. Isto porque, quando por exemplo se supunha que disparasse no marcador para uma vantagem confortável, as "universitárias" respondiam prontamente, situação mais visível no decorrer do quarto período, altura em que lograram chegar à igualdade e forçar o prolongamento, depois do lance polémico de uma falta sobre Vaneza Júnior, não assinalada pelo juiz internacional Abreu João, mesmo nas suas barbas.
O período extra trouxe duas realidades completamente díspares: uma sinfonia harmonicamente perfeita, música penetrante e a um ritmo maravilhoso, do lado do Ferroviário; um adormecimento incompreensível, como se as forças da equipa tivessem sido reguladas somente para 40 minutos, pelo ISPU. Ora, porque as decisões dos campeonatos, por vezes, acontecem em fracções de segundos, as "locomotivas" souberam, nesse período, vincar todo o seu virtuosismo e mostrar que continuam verdadeiras damas de ferro, oferecendo um feliz Natal a elas próprias e a toda a família verde-e-branca...
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